segunda-feira, 29 de março de 2010

Pá!

Estou de férias. Pensei ir até Amsterdam para fumar umas ganzas até cair para o lado. Depois lembrei-me que não sabia para que lado devia cair. Para a frente? Não existe para a frente. Para trás? Nunca, nenhum estado de inconsciência me faria esquecer o pesadelo que fica atrás. Resta-me a esquerda e a direita. Politicamente nunca cairia para a direita, por muito forte que fosse a ganza. Para a esquerda! Sim para a esquerda... invariavelmente, onde nada nem ninguém me ampara a queda: "Alevantati pá!"

quinta-feira, 25 de março de 2010

Por mais que te sonhe, não te saberei de outra forma: um sonho. Dizes me ao ouvido palavras que não existem, vestes -me as cores inventadas no velho carrossel, contas-me histórias. Envolves-me nos teus braços em cheiro de algodão doce. É assim que durmo nestas noites, sob um sol que não pára de brilhar.

segunda-feira, 22 de março de 2010

Passeei em campos salpicados de papoilas. Bastava-me a sua cor de sangue e o toque macio que me levava por caminhos de seda que nunca conheci. Ensinaram-me a colhê-las, a dobrar as pétalas ao contrário, a arrancar os "cabelos" negros que lhe revelavam um rosto. As pétalas eram saias, o pé, o único apoio para a sua coreografia. Em segundos passavam de papoilas a bailarinas e em outros tantos passavam de bailarinas a cadáveres mutilados. Como é facil aprender a destruir os momentos de beleza e prazer.O que não conto é daquela papoila que mantenho escrita no meu peito, sempre inteira, sempre viva.

domingo, 21 de março de 2010

C'est trop facile de faire semblant

Fico em silêncio, fazendo de conta que serei ouvida. Esperando um dia em que o tempo me permita ouvir quem sou. Só ouve quem me quer, sou muda! Tudo o resto é fazer de conta, enganos, ilusões, bofetadas pela pá de um moinho em fúria! E eu? Quem sou? Amiga reles e ilegitima do tempo que sobra entre as ventanias.

sábado, 13 de março de 2010

OS

Partilhar uma chávena de chá Simples O chá O partilhar. Partilhar uma chávena de chá com um amigo Simples O amigo. Conversar em silêncio Contar histórias por inventar Apenas estar Apenas ser. Verter lágrimas De lucia-lima O chá. Sabor doce Travo a sal O amigo.

sexta-feira, 12 de março de 2010

nocturno em Sol

Soltou-se um grito na escuridão, acordou a cidade em sobressalto. Estou só... e não quero estar aqui!

segunda-feira, 8 de março de 2010

Mulher Con Sumo

A cada oferta e talão de desconto, amostra gratuita e voucher de spa, apetece-me responder com as palavras de António Gedeão, ditas de um só fôlego, bebidas de um só trago e cuspidas com orgulho... Calçada de Carriche "Luísa sobe, sobe a calçada, sobe e não pode que vai cansada. Sobe, Luísa, Luísa, sobe, sobe que sobe sobe a calçada. Saiu de casa de madrugada; regressa a casa é já noite fechada. Na mão grosseira, de pele queimada, leva a lancheira desengonçada. Anda, Luísa, Luísa, sobe, sobe que sobe, sobe a calçada. Luísa é nova, desenxovalhada, tem perna gorda, bem torneada. Ferve-lhe o sangue de afogueada; saltam-lhe os peitos na caminhada. Anda, Luísa. Luísa, sobe, sobe que sobe, sobe a calçada. Passam magalas, rapaziada, palpam-lhe as coxas não dá por nada. Anda, Luísa, Luísa, sobe, sobe que sobe, sobe a calçada. Chegou a casa não disse nada. Pegou na filha, deu-lhe a mamada; bebeu a sopa numa golada; lavou a loiça, varreu a escada; deu jeito à casa desarranjada; coseu a roupa já remendada; despiu-se à pressa, desinteressada; caiu na cama de uma assentada; chegou o homem, viu-a deitada; serviu-se dela, não deu por nada. Anda, Luísa. Luísa, sobe, sobe que sobe, sobe a calçada. Na manhã débil, sem alvorada, salta da cama, desembestada; puxa da filha, dá-lhe a mamada; veste-se à pressa, desengonçada; anda, ciranda, desaustinada; range o soalho a cada passada, salta para a rua, corre açodada, galga o passeio, desce o passeio, desce a calçada, chega à oficina à hora marcada, puxa que puxa, larga que larga, puxa que puxa, larga que larga, puxa que puxa, larga que larga, puxa que puxa, larga que larga; toca a sineta na hora aprazada, corre à cantina, volta à toada, puxa que puxa, larga que larga, puxa que puxa, larga que larga, puxa que puxa, larga que larga. Regressa a casa é já noite fechada. Luísa arqueja pela calçada. Anda, Luísa, Luísa, sobe, sobe que sobe, sobe a calçada, sobe que sobe, sobe a calçada, sobe que sobe, sobe a calçada. Anda, Luísa, Luísa, sobe, sobe que sobe, sobe a calçada."

quarta-feira, 3 de março de 2010

Dor iminente

Inventaram-se os ponteiros para marcar o tempo. Marcam o teu tempo. Impenetráveis, insensiveis à tua dor, sem denunciar o fim, marcham sem arrependimento. Sabes que vão parar... esperas que marquem o fim. Aquele minuto que acabaste de passar pode ter sido o último. Aquela lua cheia que inunda a noite, pode ter sido a tua última lua e o seu banho de luz a tua mortalha... que te abrace para sempre Victor!