quinta-feira, 29 de abril de 2010

Madrugada de Abril - Século XXI

E se eu não dormir nunca mais? E se a vida passar a ser uma noite permanente, sem sonhos nem pesadelos? E se um dia acordar no meio de nada, vestida de coisa nenhuma, destinada a caminhar para sempre nos Centros Comerciais à procura de roupa para vestir? Vou passar a c0leccionar cartões de cliente e talões de desconto, a pedir brochuras nas agências de viagens e a parar em todas as montras de ourivesarias. Quando o corpo ceder ao cansaço, farei um colchão com as revistas de viagens sobre um banco de jardim. Cobrir-me-ei com as roupas da ultima moda Primavera Verão e inventarei um jogo de sueca, com a passarada , as cartas serão os cartões de loja e cupões de desconto. Nesse jogo será apostado e decidido qual o rouxinol que me irá manter acordada até à Liberdade voltar...Se eu chegar a adormecer... Cantava minha mãe: "Nossa Senhora disse disse, enquanto a videira subisse , não dormisse não dormisse" - assim o rouxinol estava atento e não se deixava prender pelos galhos da videira que se enrolariam fatalmente na sua patinha durante a noite.

domingo, 25 de abril de 2010

The Wall

Passa o tempo e não sei se passo com ele. Passo eu e ele fica. Quem passa não chega a lado algum, quem fica vive. Vai decidir o tempo quem fica e quem passa. Falo, mas o tempo é surdo, grito mas a vida ignora-me: tenho que conseguir ignorar o tempo e o silêncio. Estendo a mão durante a queda, procurando outra que não está lá, ou me deixo cair ou me agarro com as próprias unhas a esta parede que inventei, sem abraços, sem beijos nem afectos. Por fim, tudo o que resta é seguir os vermes e encontrar o corpo.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Sou uma bola de sabão. Vinda não se sabe de onde. Leve, leva-me o vento. Rebolo sobre mim mesma, num brilho de nada, em cor nenhuma . Odor a sabão. Chego acima da atmosfera, fora da terra, do mundo e das gentes. Enfrento tempestades de estrelas, guerras de deuses, nuvens de cinza vulcânica, desabamentos de glaciares e desmoronamentos de terra. Existo enquanto me soprares de vida. Na noite em que deixares de me sonhar, faço-me naquilo que sou: umas gotas de água nas tuas mãos nuas de anéis.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Humores nocturnos

Esta noite atirei os cobertores para o fundo da cama. Vesti-me à pressa, roupa de trazer por casa apenas e saí, sem me importar com a cama desfeita. Andei. Passei pela Mãe d'água, pelo Rato, Miradouro de São Pedro de Alcantara. Sempre a andar, a um ritmo de quem sabe muito bem para onde vai, sem cansaço. Desci a Rua do Alecrim, dei por mim na Rocha do Conde d'Óbidos e perdi-me exactamente onde me queria encontrar: na Ponte. Nao estava cansada, e estava num daqueles raros momentos em que sentia ser dona de mim. Subi ao cabo, o meu objectivo: atravessar a ponte pelos seus cabos principais, em equilibrio com a noite, sem medo, sabendo que uma queda, seria o mais digno a acontecer, já que do outro lado nada me esperava. Acabei por acordar do lado de cá, onde nada me espera, onde quem espera sou eu e não sei bem pelo quê.

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Para ti

Pudesse eu ser uma cidade inteira, abarcar nos meus braços a sua luz e com ela adormecer-te nas tuas memórias tristes. Deixar-te assim, livre para chorar, livre para partir, livre para ficar. Soubesse eu ensinar-te a contar as estrelas, mostrar-te aquela que brilha sempre, só para ti, onde se guarda voz, o sorriso e o abraço da alma de quem te fizeste gente. Mas sou pequena...

quinta-feira, 8 de abril de 2010

"You must remember this... a kiss is just a kiss..."

Leva-me! Leva-me para onde as noites brilhem. Leva-me para um segredo tão secreto como o nosso amar. Abandona-me depois, na memória deste conto, na berma dos teus caminhos, na encruzilhada das histórias que ainda não sabes, mas vais contar. Deixa-me morrer assim esta morte invisivel, nos teus braços, num sorriso, num beijo, uma morte de desejo.

domingo, 4 de abril de 2010

Cansada dos dias

Quero correr pela estrada, sem medo, sem luz. Sentir-me sacudida pela velocidade que passa indiferente. Esquecer-me do corpo, do destino que não sei prever nem precaver.Deixar-me levar pelo impacto, ser projectada para o espaço e não voltar nunca mais.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

"take me home you silly boy, put your arms around..." esta maré leva-me a ti, arrasta-me pelo areal, traça a sangue e sal o mapa dos nossos corpos. para que te não percas na volta, inundando de vida e sabor o que somos: marés que vão, marés que vêm