sábado, 12 de junho de 2010
um bocadinho do que escrevi ontem...
"As lojas estavam fechadas, no banco de jardim perto da paragem de taxis, já aguardavam pela ceia os sem-abrigo do costume. Tão cedo? Mal amanheceu! Talvez agora também distribuissem pequeno almoço nas carrinhas de voluntários. Isso era bom!
Resolveu esperar pela abertura das lojas, só para entrar lá dentro e sentir o toque das roupas novas, o cheiro dos perfumes. Desceu a Guerra Junqueiro, e reparou que o sem abrigo que faz a cama junto à Zara ainda não tinha arrumado a "cama". Quando chegou ao fim da rua, a luz começou a escassear. Fez-se noite. Afinal a cama já estava feita. Na Almirante Reis, saiam dos autocarros mulheres com cheiro a lixivia, apressadas de regresso a casa. Em redor dos sem-abrigo, câmaras de filmar, pessoas com coletes reflectores a oferecer a única refeição: a ceia, composta do pão que mais ninguém quer comer e bolos fora de prazo.
Desconcertada, voltou para casa, não sem parar na Praça de Londres por debaixo de uma árvore iluminada, aí parou, ergueu o olhar para contemplar as pequenas luzes, semi cerrando os olhos, só para se sentir parte de um firmamento onde não existe amanhecer."
quinta-feira, 10 de junho de 2010
Hoje choveu e fez sol. As bruxas comeram pão mole.
Festim macabro nas ruas molhadas, danças sem nexo.
Feitiços foram lançados, fogo fátuo indiferente à chuva cegava quem os olhasse.
O mundo escondeu-se, protegeu-se nos centros comerciais...
Lá dentro livraram-se do dinheiro, encheram-se de inutilidades,
compraram sorrisos, venderam angústias.
Esqueceram a chuva, as danças de bruxas, o fogo fátuo e mesmo sem o olhar cegaram,
O beijo que o Sol lançou às àrvores, devolveu o brilho às folhas,
tremeram as folhas de prazer, acordaram as aves,
E amornou a terra que se fez meu leito.
sábado, 5 de junho de 2010
Cio do amanhecer
Recordo o caminho do teu corpo e nele me perco.
Saboreio o teu doce até se tornar sal.
No aperto dos teus braços segredo-te o meu folego
Dedilhas-me até ser eu própria as tuas mãos,
desfazer-me no prazer que somos,
Nesta Primavera em que me aqueces,
serei a tua viola, o teu gemido de prazer,
o teu fado vadio.
Canta-me que me levas a voz,
roubas-me os verbos e enches-me de vida!
terça-feira, 1 de junho de 2010
Lucky Day
"Ladies and gentlemen. Harry's Harbour is proud to present, under the big top tonight. Human Oddities. That's right!"
O palhaço multicores avançou para mim. Pernas curtas, tronco largo, cara pintada de vermelho e preto. Roupa de cetim vermelha, azul e branca.
Ria-se. Ria-se de mim porque a esquisita era eu.
Toma um ar sério, bebe um shot de vodka ao som de uma polka e fala:
- Minha querida, tens tudo para ser tudo! Aponta uma cova de terra fresca no chão. Ao lado uma lapide tombada e inacabada. Continua, olhando nos olhos: - Mas não és! E ri, ao principio gargalhadas contidas até que as solta na sua plenitude - Mas não és! - Estas palavras são a sua gargalhada no mundo inteiro onde trompas e trompetes, realejos e gaitas de foles tocam em desalinho.
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