domingo, 26 de fevereiro de 2012

a escolha

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Atravesso a vida
Sou só eu
falésia prestes a desmoronar
e mar
Salto a cerca
uma despedida
um último olhar
É o voo
a queda livre
Solto o último fôlego
despede-se a vida
em cada bolha de ar
Abafo os sons de uma vida inteira
e a fúria
Dançam-me os cabelos
em melodia silenciosa
percussão num corpo gélido

nada mais que mar, nada mais que Sal

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domingo, 19 de fevereiro de 2012

lisboa de viés

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Lisboa amanheceu enviesada. O mundo convergiu para o rio, em todo o seu peso. O Marquês de Pombal desceu aos Restauradores e o Teatro Nacional D. Maria II ao Terreiro do Paço. Ali, à beira rio, o mundo deixou-se ficar. Era ali que estava o Sol, era ali que estavam os risos das crianças, o brilho de todas as coisas.
O resto da cidade deixou de acontecer, os relógios pararam. Era no rio que estava a vida, pulsando com toda a sua força, cantando de todas as cores, gritando ao  Amor que ainda não foi desta que morreu.


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terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Nim

Aos dez anos recebi a primeira declaração de amor, ele olhou-me nos olhos e disse: - Sabes uma coisa? Gosto de ti! - Foi um murro no estômago... Um rapaz a gostar de mim... O céu caiu, toda eu tremi e o mundo parecia que ia acabar. Fugi-lhe sem nunca lhe ter respondido. 
Depois eles foram pedindo: - Queres namorar comigo? - Mais um murro no estômago, respondia que ia pensar, umas vezes acabava por responder que sim, outras que não.
A partir de certa altura, deixaram de ser formais, um beijo no lugar da pergunta. O primeiro beijo... um murro no estômago, o céu de novo a cair, o mundo a acabar... dias de luz e cor. Foi nessa altura que as palavras começaram a ganhar importância, pois deixaram de ser ditas. Por fim, desvendei o código: primeiro era um "gosto muito de ti", depois um "adoro-te" (neste nível pensava: também adoro queijo e não namoro com queijos) até que chegava o "amo-te" e eu iluminava-me. O murro no estômago começou a ser servido no fim, quando o desapontamento chegava, para mim, para ele ou para ambos, acabando assim o mundo. O céu, esse, passou cair no FIM.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

mais de nada

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as palavras que nos uniram
são as mesmas que nos separam
leio-te na mesma aguarela
numa cor a que não pertenço
fujo das palavras
afasto-me da estrada
fujo do tempo
não quero mais de nada
que pare o vento e o mar engula a falésia
que a onda leve o passado
e me deixe só na minha amnésia
NÃO QUERO MAIS DE NADA
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