Fugi, julguei desligar-me do mundo e ter encontrado um lugar seguro, sem memórias. A manhã estava fria, o chá, só de camomila... escolhi aquele lugar, aquela esplanada deserta, por estar em frente ao lago, longe do alcatrão da cidade. Olhando em redor, com precaução, conseguia só ter verde no meu raio de visão... e o cisne branco.
Asas abertas, era sem dúvida a vedeta do lago. As raras pessoas que passavam, todas aos pares, paravam para o fotografar.
Da beira do lago onde me sentei, aproximou-se um cisne negro. Ninguém reparava no cisne negro. Impaciente, nadava de um lado para o outro, parecia querer galgar o limite do lago a qualquer instante. O cisne branco ergueu-se na sua brancura e correu sobre as águas em direcção ao cisne negro.
O empregado que só tinha chá de camomila correu, atirando pedras na sua direcção, sem atingi-lo, mostrando-lhe apenas que aquele não era o caminho. Indiferente, o cisne branco, vedeta do lago, continuou, investindo sobre o cisne negro. Só uma pedra atirada mais perto o demoveu.
Afinal, havia outro cisne negro, com quem o cisne branco continuou o passeio no lago.
O outro, o meu cisne negro, permanecia no canto do lago, perto de mim. Saiu da água, deixando que o sol iluminasse as gotinhas de água presas ao seu corpo negro. Eram pequenos diamantes. Com dignidade, secou-se ao sol, sacudiu-se e alisou as penas com o bico vermelho sangue. Por fim, ergueu-se com dignidade de primeira bailarina e abriu as asas majestosas. Sem sinal de dor, Negras, enchendo a manhã fria e Só de Lisboa.
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