domingo, 16 de setembro de 2007

O gato O gato negro enrola-se em si mesmo, na sua negrura. Dorme e sonha negros sonhos. Satisfeito com a sua vida de ausência de cor, na certeza que irá acordar apenas para mudar de posição, lamber as próprias patas com carinho, mergulhar de novo na escuridão do sono e dos sonhos. O gato negro podia não ser gato, podia ser gente, com cor ou sem ela, se é que é permitido atribuir cor às gentes. Acontece que escolheu ser gato, com o privilégio de escolher a cor. Escolheu ser negro, apenas negro, para se confundir com a noite, com a ausência de luz. Da mesma forma, escolheu ser gato e não outra coisa qualquer, apenas um gato. Os gatos escolhem os donos. O gato negro foi escolhido e não se importou. Durante o dia vagueia pelos telhados da cidade, espreita as gentes que passam a correr lá em baixo… pequeninas, aquelas gentes. Não precisa de apurar muito o seu ouvido para perceber que os seus corações batem a mil à hora, sem terem sequer consciência dessa batida. Quando chega a noite, regressa a casa do dono, onde bebe água fresca, mastiga ração seca ruidosamente, lava-se e por fim deita-se. Se lhe quiserem fazer uns carinhos pelo meio aceita, senão, o carinho que dá a si próprio basta-lhe para se sentir feliz. Cuida-se e isso fá-lo sentir-se bem. Um dos seus sonhos preferidos é com o Sol. Sonha que o Sol é uma gata enorme, quente, brilhante, que o abraça e se deixa possuir vezes sem conta, sem dor, sem aquela dor com que as fêmeas se costumam fazer pagar por escassos momentos de prazer. Sonha que possui o Sol durante um tempo sem fim, com prazer continuo, regular, como um êxtase que não começou nem acabará nunca… e sorri levantando os bigodes. (to be continued...)

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