sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Meio dia

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A campainha toca e eu estou ainda meia despida. Abro e espero. Ninguém. Vou para o banho. Estou apenas meia vestida quando toca de novo a campainha. Abro e espero. Ninguém. Deixo-me cair sobre a cama meia desfeita. Completamente desfeita estou eu. Vivo a vida meia vestida, meia despida. Abro a porta sempre que tocam à campainha. Nunca é ninguém. Neste ponto digo-me: " - Alguém anda a brincar contigo. Para a próxima não abras."  Mas pergunto-me... e se de nunca a abrir me esqueço um dia que tive uma porta que podia ser aberta? As paredes acabarão por me deixar meia esmagada, meia despida, a meio caminho de uma janela com vista para o rio...por fim meia morta, porque agora estou meia viva.

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quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

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Antes sequer de formar uma letra, risco, risco, risco, até se tornar claro o ruído do bico da caneta a raspar o papel. Não me interessa se a tinta é preta, se o papel é azul ou branco. Quero ouvir o raspar do bico da caneta no papel. Rasga-se a folha, não aguentou a força e a raiva contida na escrita que nunca o foi, nem palavra, nem letra, nem rabisco. Atiro a caneta contra a superficie dura da mesa, faz ricochete e cai ruidosamente no chão. Piso-a, esmago-a, não vá ela ganhar vida e escrever o que lhe vai na alma. Amachuco o papel, a folha fica amassada, uma bola que atiro contra o espelho partido. Mais uns estilhaços caem, ainda sobram uns tantos para outras expressões de raiva ou descrença. Fica o silêncio, contado pelo ponteiros do relógio desacertado. Não conto o tempo, não conto o tempo que passou, não conto o tempo que falta para um qualquer número redondo destinado a contar o tempo que te levou... que me levará a ti... que não me responde por que já te não tenho.

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quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Solsticio de Inverno ou a Festa dos Loucos ou o Natal

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A noite mais longa chegou por fim. Fadas e duendes dançaram à luz da lua. Fez-se uma fogueira e aqueceram-se os corpos. Dançou-se sem descanso numa noite sem fim. Foi assim o principio, os loucos tomaram o poder e inventaram um novo inicio: a esperança de uma vida nova. Homens e mulheres trocaram as vestes e os sexos, dançaram com os loucos, beberam com os centauros e os unicórnios. Quando a noite sem fim chegou ao inicio de um novo principio, apagaram a festa, dormiram no chão e acordaram no esquecimento.

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terça-feira, 21 de dezembro de 2010

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Comprei-me flores esta manhã, cheiro de ti
sonhei-te nu esta noite, comigo
sonhei-te nesta cama, ela sabe-te
o sabor dos teus contornos, teu corpo

comprei-me flores esta manhã, cheiro de ti
desejei-te mais de mil vezes, nos meu braços
desejei-te dentro da minha roupa, quente
o cheiro de ti abrindo caminho na carne

comprei-me flores esta manhã, nascidas de nós


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sábado, 18 de dezembro de 2010

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Pois que se faça o Sol e o Vento
                              e que se varra o lixo das ruas
Pois que se ofereçam laços e papéis 
                                     e se embrulhem as crianças nuas
Pois que se esvaziem os hospitais e se pinte uma Noite
                                              e se faça uma estrela com pedaços de pincéis
Pois que se aqueça a cama de papelão e Esquecimento
                                                     e se sirvam sopas e melodias
Pois que me deixem gritar bem alto o Lamento
                                                     e me calem com sonhos e azevias
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sábado, 11 de dezembro de 2010

Paris, je t'aime!

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Meu amor
Meia mentira, meia verdade
não és meu... amor
és o segredo da liberdade

Meu amor,
Meia mentira, meia verdade
és o amor, o que sabemos de cor
largado no areal pela tempestade

Meu amor
Meia mentira, meia verdade
és amor, migalha levada no vento
vagabundo inventado da minha cidade



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sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Espelho meu

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Hoje o espelho nada reflectiu. Deixou-se ficar ali, a olhar para mim, sem que eu pudesse retribuir o olhar. Vazio, o espelho. Atrevi-me a tocá-lo, as pontas dos dedos. Gelado, o espelho. Ali, derramei as lágrimas contidas numa vida. Salgado, o espelho. Ali, gritei as dores que me corroem a alma. Estilhaçado, o espelho.

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quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

sábado, 4 de dezembro de 2010

a dor de cor

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... hoje acordei com o grito do silêncio

Era uma voz muda na solidão
uma cama vazia de corpos em turbilhão
Era a ausência, a falta de ar
E o meu corpo quebrado, a gelar


...hoje acordei sabendo a dor de cor

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